Plástico permeado com nanopartículas ajuda a tornar as garrafas de cerveja da Miller Brewing Co. menos propensas a quebrar, ao mesmo tempo que amplia o período de durabilidade da cerveja na fase de armazenamento. A mistura de bebida nutricional Toddler Health, da Simply H, inclui 300-nanômetros (300 bilionésimos de metro) de partículas de ferro. E uma ampla variedade de itens de cozinha e limpeza agora emprega partículas de prata de tamanho nano para matar micróbios.
No entanto, o grupo ambiental Friends of Earth (FoE) [em português Amigos da Terra] sediado em Washington, relata que nenhum dos mais de 100 produtos de comida ou relacionados a comida em que eles identificaram a presença de nanopartículas – partículas minúsculas entre 100 e um nanômetros – tem um aviso no rótulo ou passou por algum tipo de teste de segurança realizado por agências governamentais.
“Produtos criados com o uso de nanotecnologia entraram na cadeia alimentar”, diz o autor do relatório, Ian Illuminato, lobista de saúde e ambiente do FoE. “Estudos preliminares indicam que há um sério risco. [...] Temos de saber o que é seguro antes de colocarmos em nossa comida.”
O relatório se apóia em vários estudos feitos nos últimos anos segundo os quais algumas nanopartículas podem causar danos. Um estudo de 2005 publicado na Environmental Science & Technology mostrou que nanopartículas de óxido de zinco eram tóxicas para células do pulmão humanas em testes de laboratório mesmo em baixas concentrações. Outros estudos mostraram que partículas de prata minúsculas (15 nanômetros) mataram células do fígado e do cérebro de ratos. “Elas são mais reativas quimicamente e mais bioativas”, por causa do seu tamanho, que lhes permite penetrar com facilidade em órgãos e células, afirma Illuminato. “Os produtos devem ao menos ser rotulados para que os consumidores possam escolher se querem fazer parte desse experimento”.
O FoE diz que está provavelmente subestimando o número de alimentos e produtos alimentícios que contêm as minúsculas partículas, porque eles dependem de relatórios das próprias empresas e de uma lista de 600 produtos de nanotecnologia compilados pelo Woodrow Wilson International Center for Scholars (instituição de pesquisa criada pelo Congresso em 1968 para promover as associações entre estudiosos e políticos) como parte de seu projeto para estudar as implicações da nanotecnologia.
O grupo ambiental declara que o governo dos Estados Unidos não foi capaz de proteger consumidores dos perigos potenciais das nanopartículas e exige uma proibição de seu uso em alimentos e produtos relacionados, até que elas tenham sido testadas a fundo para eliminar a possibilidade de riscos à saúde.
Hoje em dia a Food and Drug Administration (FDA, a agência de controle de alimentos e remédios dos Estados Unidos) não exige especificamente provas de que nanopartículas sejam seguras, mas determina que os fabricantes forneçam testes capazes de comprovar que os produtos alimentícios que as utilizam –seja cerveja ou comida para bebês – não são nocivos. “A indústria terá de arcar com o ônus de demonstrar a segurança do material sob as condições de uso para as quais ele é concebido”, diz Christopher Kelly, porta-voz da FDA. “Versões de nanopartículas de materiais [aprovados pela FDA] podem muito bem ser novos materiais” que irão exigir novas investigações, “e isso será considerado caso por caso”.
Até o momento, há poucos estudos dos meios científicos, da indústria ou do governo publicados sobre os impactos ambientais e sobre a saúde das nanopartículas. Para complicar ainda mais a questão há o fato de que as nanopartículas estão presentes no suprimento de comida há anos. “Nanopartículas estão nos produtos alimentícios há décadas, nós apenas nunca percebemos que elas estavam lá”, diz o físico Andrew Maynard, conselheiro científico chefe do projeto Wilson Center. “Precisamos entender melhor como o nano pode ser benigno em alimentos, mas também onde se encontram os perigos”.
Por exemplo, ainda não está claro se as nanopartículas usadas no empacotamento de alimentos podem migrar ou se infiltrar na comida ou bebida. E se desconhece completamente que impacto uma ampla variedade dessas nanopartículas pode ter na saúde humana.
Várias agências governamentais, incluindo a FDA e Environmental Protection Agency (EPA, Agência de Proteção Ambiental), mostraram interesse em nanotecnologia. No ano passado, o governo dos Estados Unidos gastou mais de US$ 1,4 bilhão em pesquisas sobre nanotecnologia como parte da Iniciativa Nacional de Nanotecnologia, um esforço conjunto de 25 agências federais que investigam ganhos e os perigos potenciais da tecnologia emergente. Dessa quantia, aproximadamente US$ 40 milhões foram destinados à pesquisa de saúde e segurança (uma quantia que deverá quase dobrar, chegando a US$ 76 milhões no orçamento proposto do ano fiscal de 2009).
A FDA não pode fornecer dados sobre quanto gasta para avaliar a segurança de nanopartículas.
A EPA recebeu US$ 8,6 milhões desses US$ 40 milhões, dos quais cerca de US$ 3 milhões foram direto para laboratórios para a pesquisa dos riscos potenciais à saúde e ao meio ambiente, de acordo com Jim Willis, diretor da Divisão de Controle de Substâncias Químicas da EPA.
A EPA e suas contrapartes no Canadá, Europa, Ásia e Austrália também começaram em fevereiro um estudo de três anos sobre os efeitos de 14 nanomateriais – incluindo prata, ferro e outras nanopartículas elementares bem como nanotubos e nanobolas de carbono. “Quando tivermos os resultados da primeira fase, iremos considerar a idéia de passar para testes mais aprofundados em alguns desses nanomateriais ou talvez em algum outro”, diz Willis, acrescentando que qualquer nova substância química para aprovação que contenha 10% ou mais de elementos de tamanho nano recebe atenção especial dos avaliadores da EPA. “Nós vimos cerca de 30 nos últimos três anos”, diz ele.
Em 2006, a EPA começou a regulamentar o uso de nanoprata como um pesticida dentro da Lei Federal de Inseticidas, Fungicidas e Rodenticidas. Como resultado, empresas que utilizam essas partículas de nanoprata (como um antimicrobiano numa vasta gama de mercadorias que vão de computadores a panelas) precisam registrá-las como pesticidas. Em março deste ano, a agência multou a fabricante de equipamentos Iogerar, de Irvine, Califórnia, em US$ 200.000 por ter deixado de registrar a nanoprata antimicrobiana em alguns de seus teclados sem fio e mouses.
Em janeiro a agência também pediu a empresas que usam nanopartículas para começar a fornecer resultados voluntariamente de quaisquer estudos de saúde e segurança que tivessem realizado. Willis diz que a EPA irá avaliar a resposta das empresas para determinar se o atendimento voluntário a essa solicitação é suficiente para essa temporada de calor nos Estados Unidos.
O Friends of Earth insiste que a obediência a esses relatórios deveria ser obrigatória, dados os riscos potenciais. O grupo lobista também diz que a definição do que constitui uma partícula de tamanho nano deve incluir qualquer coisa com 300 nanômetros ou menos. Porém Maynard, do Wilson Center, salienta que é o efeito e não o tamanho que tem importância.
“Tudo se resume à necessidade de mais pesquisas. Nós não podemos andar às cegas aqui. Precisamos saber o que está acontecendo”, insiste Maynard. “Não há evidências concretas de que nanomateriais em produtos no mercado irão ser nocivos a humanos ou ao meio ambiente, mas há evidências suficientes para se afirmar que precisamos reexaminar isso”.
Fonte: Scientific American - David Biello