SHAT KRIYA: A FAXINA INTERNA

Em nossa sociedade moderna, principalmente na Ocidental, limpeza e higiene são sinônimos de dentes escovados, banho tomado e unha cortada. No entanto, acabamos por esquecer que nosso corpo, nosso organismo, vai acumulando ao longo dos anos várias toxinas e podridões que servem apenas para gerar dor e doença. Assim, uma das tarefas do Hatha Yoga é purificar, limpar essa bagunça, de modo que as práticas sejam realizadas de uma forma mais clara e ordenada.

De acordo com o Hatha Yoga Pradipika (2.21 - 2.23):

Quando gordura ou muco são excessivos, os shat kriyas ou shat-karma, ou "seis técnicas de limpeza", devem ser executados antes. As pessoas que têm os três doshas ( fleuma, ar e bile) em equilíbrio não precisam disto. Dhauti, basti, neti, trataka, nauli e kapalabhati - estes são os shat-karma. Estes shat-karma que purificam o corpo são secretos. Possuem inúmeros e maravilhosos resultados e são tidos em alta estima por eminentes yogis. Por meio destas práticas a pessoa se livra do excesso  dos doshas.

Em sua forma mais antiga, o Hatha Yoga consistia basicamente dos shat-karma. Shat significa seis e karma significa ação, referindo-se à uma seleção de seis grupos de práticas purificatórias. Por meio destas técnicas procura-se criar uma harmonia completa no corpo, na mente e nas correntes de energia vital ou prana.

Já no primeiro verso (2.21) Svatmarama declara a profunda relação que há entre o Hatha Yoga e antiga ciência do Ayur Veda, a medicina tradicional indiana, cuja teoria de saúde/doença é fundamentada na existência de três humores ou doshas que compõem o corpo humano: kapha ou muco; pitta ou bile; e vata ou ar. Tanto para o Hatha Yoga quanto para o Ayur Veda a doença é causada por um desequilíbrio nesta tríade. Embora as técnicas aqui empregadas sejam diferentes das utilizadas pela medicina do Ayur Veda, o objetivo é o mesmo: equilibrar estes humores internos como uma preparação para as práticas mais avançadas. Gheranda, um outro grande mestre de Hatha e ao qual se atribui a autoria da Gheranda Samhita afirma categoricamente:

O vayu (o prana no interior do corpo) não pode entrar nas nadis se estiverem cheias de impurezas. Como pode então o pranayama ser dominado? Como pode haver conhecimento dos tattvas (níveis de existência)? Por isso, primeiramente se deve purificar as nadis para depois então praticarpranayama. ( Gheranda Samhita 5.35).

O que são essas impurezas? É tanto a matéria física quanto a energia sutil acumulada ao longo de nossa existência, como excesso de gases intestinais, fezes retidas, má circulação sanguínea, respiração deficiente, excesso de alimentação, sentimentos de raiva, medo, luxúria, etc. Com elas no caminho, toda a energia obtida pelo pranayama será usada apenas para a sua remoção, retardando em muito a evolução do praticante, já que o objetivo do pranayama é gerar uma mente clara e iluminada, apta para os estados mais profundos de contemplação, como afirma Pataìjali:

Através do pranayama, que é o quarto entre os oito membros, a mente adquire a capacidade para a verdadeira concentração. (Yoga Sutra 2.53)

Assim, realizando estes shat-karma  o yogin pode vencer facilmente um grande obstáculo, deixando seu caminho livre para que os efeitos das práticas alcancem rapidamente seu objetivo. Mas por quê, então, elas devem ser consideradas um segredo (2.23)? Há duas razões: a primeira é evitar que pessoas sem a preparação suficente possam entrar em contato com esse ensinamento e, praticando de maneira errada, se machuquem ou agridam severamente o seu corpo; a segunda é "freiar a língua" do praticante que adora comentar com todo mundo o sucesso de sua caminhada.

O Hatha Yoga tornou-se célebre ao longo dos séculos pelo poder curativo e transformador que estas práticas têm, e embora sejam descritas apenas seis, cada uma tem uma variedade de opções. Na tabela abaixo você encontrará, além dos shat-karmas descritos por Svatmarama em seu Hatha Yoga Pradipika, outras variações ensinadas por Gheranda, em sua obra Geranda Samhita.

SHAT-KARMAS

VARIAÇÕES

1. DHAUTI

Antar-dhauti (interno)

vatsara (similar a plavini mudra)
varisara (conhecido como shankha- prakshalana)
vahnisara (conhecido como agnisara)
bahiskrita (limpeza retal)

Danta-dhauti (dentes)

jihva (língua)
karna (orelhas)
kapalrandhra (sinos frontais)
chakshu (olhos)

Hrid-dhauti (cardiaco)

vastra (algodão)
danda (bastão)
vaman (kunjal e vyaghra)

Mula-shodhana (anal)

2. BASTI

Jala (água)
Sthala (seco)

3. NETI

Sutra (fio)
Jala (água)
Dugdha (leite)
Ghrita (gi)

4. TRATAKA

Antaranga (interno)
Bahiranga (externo)

5. NAULI

Dakshina (direita)
Vama (esquerda)
Madhyama (central)

6. KAPALABHATI

Vatakrama (respiração)
Vyutkrama (reverso)
Shitkrama (assoprando)

Fonte: INSPIRE YOGA

 


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